Sexta, 11 Setembro 2020 12:18

Considerações sobre a aplicação da decisão do STF Referente a não incidência de ICMS nas transferências

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Após muita leitura e estudo, bem como troca de ideias com outros profissionais da área, elaboramos este material para esclarecer nossos clientes em relação a aplicação da decisão do STF sobre as operações de transferência e a não incidência do ICMS.

Notório que, no final de agosto de 2020, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão virtual, reafirmou a jurisprudência da Corte e declarou a não incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte localizados em estados distintos.

Em votação majoritária, os ministros deram provimento ao Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1255885, com repercussão geral reconhecida, e confirmaram o entendimento de que o tributo apenas incide nos casos em que a circulação de mercadoria configurar ato mercantil ou transferência da titularidade do bem.

A tese de repercussão geral fixada (Tema 1099) foi a seguinte: “Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia”.

Com esta introdução, passamos a avaliar os seguintes questionamentos:

Pode o contribuinte aplicar em suas operações de transferência em geral, sem esperar uma resposta dos Estados envolvidos nas operações?

Lembramos que, trata-se de decisão judicial, e não de mudança de Lei.

Desta forma a aplicação será obrigatória apenas quando houver alteração na Lei Federal do ICMS, que hoje dispõe:

LEI COMPLEMENTAR Nº 87, DE 13 DE SETEMBRO DE 1996

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

Assim, sua adoção será obrigatória quando houver mudança na lei federal, até lá, o contribuinte que desejar aplicara a decisão, deve buscar a assistência jurídica, com seu departamento jurídico interno ou escritório de advocacia contratado para avaliar a melhor alternativa judicial.

Ressaltamos que não há mudança de lei, então, a aplicação desta não incidência poderá sujeitar o contribuinte à autos de infração.

Porém, por se tratar de julgamento em repercussão geral, judicialmente, haverá a obrigação da aplicação da decisão em comento, o que levará o Estado a perder a ação, em regra, caso o contribuinte recorra do pretenso auto.

Outro ponto importantíssimo é: cuidar com extensões do teor da decisão, pois o caso que gerou a discussão foi:

No caso concreto, a proprietária de uma fazenda em Mato Grosso do Sul teve negado mandado de segurança por meio do qual buscava impedir a cobrança de ICMS em todas as operações de transferência interestadual de parte de seu rebanho de bovinos até outra fazenda de sua propriedade, localizada em São Paulo (SP). A empresária apelou ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul (TJ-MS), que não admitiu o recurso, ao argumento de que, conforme previsão do Código Tributário estadual e do artigo 12 da Lei Complementar (LC) 87/1996 (Lei Kandir), o momento da saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte, ainda que para outro do mesmo proprietário, constitui fato gerador do ICMS.

No recurso extraordinário, a empresária sustentava que a incidência de ICMS, de acordo com a Constituição Federal, se limita aos atos de mercancia, caracterizados pela circulação jurídica do bem em que há transferência de propriedade e que o transporte de sua mercadoria não se enquadra nessa hipótese. Alegava, ainda, que a decisão do tribunal estadual ofende a Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a jurisprudência do STF acerca da matéria.

O caso analisou: a transferência interestadual e de mercadorias (gado).

Assim:

Pode, então, aplicar a decisão para transferências internas?

No caso, teríamos outra tese, que seguiria a principal (“o mero deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos de propriedade do mesmo contribuinte não configura circulação de mercadoria, descaracterizando-se, portanto, o fato gerador de ICMS”), e tal argumento e estratégia poderão ser usados pelo jurídico responsável, após sua avaliação particular.

E no caso de transferência de ativo ou material de uso e consumo?

Da mesma forma, para os Estados que tributam estas operações, também se trata de outra tese, lembrando que, a discussão neste caso, também leva em conta o conceito de mercadoria, pois o ICMS incidiria apenas na circulação desta. Ativos são bens, e uso e consumo tem mais ligação com o conceito de material, e com encerramento da cadeia de tributação.

Nosso principal receio em relação ao desdobramento da aplicação desta tese, vem a seguir:

Pode o Estado de destino glosar o crédito de uma transferência, no caso de um contribuinte que opte por continuar aplicando a tributação pelo ICMS?

 

Em anos de consultoria preventiva, já vimos de tudo no que se refere a entendimento do fisco Estadual em geral...

Desta forma não há como afirmamos que este ponto não será aventado, porém, no caso da glosa do crédito, temos muitos argumentos que podem ser usados para combater um auto, como, por exemplo, a ausência de alteração da lei complementar, a irretroatividade com intuito de prejudicar o contribuinte, dentre outros.

O que precisa ficar muito claro é: o contribuinte que desejar colocar em prática desde já a medida visando a aplicação da não incidência, terá que enfrentar uma série de desdobramentos, que não terão resposta, e alguns problemas técnicos, como por exemplo:

- Impactos no cálculo da substituição tributária – certamente não teremos tão cedo o posicionamento dos fiscos sobre como fica o cálculo neste caso, e, se houver, certamente, será destinado ao contribuinte que possua sua própria ação judicial resguardando seu direito.

- Qual o código de ajuste a ser usado para a realização do estorno do crédito? Sim, devemos lembrar que, os que optarem pela aplicação da não incidência deverão estornar o crédito na escrita, e, hoje, este estorno, na maior parte dos Estados, exige código, e, provavelmente, será aplicado um código genérico, visto que não é hipótese prevista em lei ainda. Alguns Estados colocam verdadeiros entraves para a o uso de códigos genéricos, ou exigem justificativas, e, precisando justificar, é bom que o contribuinte já tenha a medida judicial cabível interposta.

- Cuidar com aplicação anterior de diferimentos e suspensões  lembrar que esta não incidência poderá ter reflexos nos recolhimentos de valores que, por força de previsões regulamentares foram acobertados por suspensões ou diferimentos em etapas anteriores, e, no caso do diferimento, não teremos no momento, artigo que permita a manutenção do crédito, de forma a cogitar a dispensa do seu encerramento de fase.

Lembramos, por fim, que a aplicação da não incidência na transferência prejudica o crédito da unidade que está recepcionando o produto, e assim, a ausência deste desconto deve ser levada em consideração no custo de partida que alimentará a formação de preço.

Para empresas interessadas em fluxo de caixa, ou com créditos acumulados, porém, a decisão pode ser interessante, mas reforçamos que a sua aplicação precisa do amparo de medida judicial para evitar maiores problemas.

Os contribuintes que não desejarem aplicar a medida, podem ficar tranquilos, podem continuar a destacar o ICMS em suas transferências, apenas acompanhando as alterações nas legislações, e contando conosco para enviar as mesmas, assim que forem publicadas.

Modificado em Terça, 15 Setembro 2020 21:36
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